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29 de jul. de 2013

Mudar o mundo

Uma opinião é válida quando permite que outra venha ao encontro para questionar, somar, filtrar ou controverter, mas, definitivamente, uma coisa não pode ser tolerada hoje em dia, o desrespeito público à liberdade alheia, seja este desrespeito manifesto por palavras, atos ou gestos.

Não vou pegar carona na popularidade do Papa em sua visita ao nosso país, pois isso apenas repercutiria o que muitos já falaram e, com certeza, minha fala amadora seria menos relevante que as matérias profissionais. Também não vou condenar os manifestantes contrários à JMJ (nomeadamente a marcha das vadias), já que isto seria muito fácil, pois eu sou católico e tenho um repertório de milhões de fiéis estudiosos ou não que falam a meu favor, eu seria só um papagaio a defender meu ponto de vista com afirmações de outrem em novas roupagens interpretativas, isso sem contar que até pessoas contrárias à Igreja enojaram tais manistações vadias.

Então, me restou apenas uma coisa para preencher este espaço, vou escrever sobre contradição, hipocrisia e mediocridade.

Contradição é quando uma pessoa (incoerente) proclama uma antítese daquilo que acredita, acreditando estar fazendo a coisa mais correta que existe, ou seja, por um descuido de planejamento racional ou intelectual, acaba falando algo que contradiz sua própria luta, até o ridículo de se autocombater, como uma espécie de manifesto autoimune fadado ao fracasso e semelhante à expressão popular: pobre coitado...cava ele(a) a própria cova.

Já a hipocrisia tem diversas vertentes interpretativas que podem ser aplicadas em diferentes circunstâncias e ambientes de convívio social, mas, frequentemente, talvez na maioria das vezes, esta palavra é aplicada ao ambiente religioso e ideológico. Em suma, hipócrita (manifestante de fingidas virtudes) é aquele que não tem vergonha de ser pego fazendo aquilo que condena. Claro, quando sua percepção tem condições de compreender que está factualmente distante de seus discursos (do contrário, o coitado nem percebe), aqui, diga-se de passagem, discursos capazes de cobrar do outro um peso e uma medida jamais antes por ele(a) testemunhados.

E medíocre é todo aquele que atinge um patamar qualitativo que lhe confere o rótulo, por ele mesmo nele estampado, de ser chamado e reconhecido como “desprezível”. Ainda que muitos o prezem, nada mais são, unidos, do que um monte desprezível de seres medíocres, sofríveis e vulgares. Bradam ferozes e sem limites, atropelando tudo e todos. Nunca conquistaram nada em suas vidas e tão pouco construíram algo pelo que se vale a pena investir credibilidade, mas odeiam sem razões racionais os grupos que pensam diferente e hoje ocupam um certo lugar de evidência e relevância na sociedade (não obstante as contrariedades causadas para ocupar estes espaços, ainda assim é preciso ter conquista semelhante para poder combater).

Não quero atribuir estas palavras a ninguém, mas quando uma pessoa se levanta contra a liberdade da outra, liberdade essa, aliás, por todos defendida aos gritos, soma as três categorias acima em si mesma, transformando-se em tudo aquilo que ele combate e materializando o atroz desrespeito com o qual nunca quer ser tratado.

Isto foi o que refleti durante os últimos dias, percebi que muitas vezes fui contra o que acredito por me outorgar o direito ilícito de determinar modo de vida ao outro, esquecendo que se não há liberdade não há adesão pura. E toda discussão é vazia se ambas as partes não estão dispostas a escutar seriamente e sem alienações subjetivas a verdade que rege a vida do outro, considerando suas causas reais e sinceras circunstâncias.

Desejo que este texto seja um norte para minhas relações e ajude-me a ser mais coerente com o que acredito, ao ponto de permitir ao outro questionar-me livremente sem ser punido com o distanciamento do meu respeito e bons tratos. Mas desejo também que o leiam os fieis das denominações religiosas e das religiões, que o leiam os de opção homossexual, as feminista, os espiritualistas, os ateus, os que não estão em nenhum desses grupos e os que trafegam por todos eles...

Quem sabe possamos inaugurar uma cultura de real liberdade, respeito e convivência harmoniosa, como uma unidade na diversidade. Construída por meio de discussões maduras onde a “opinião” não seja um “pseudo-deus” pelo qual mato e morro sem nenhum proveito, mas seja um elemento de desenvolvimento humano que permita a todos uma vida feliz e livre.

A vida é mais que um octógono de opiniões e mudar o mundo exige mais força pacífica do que podemos imaginar.

23 de jul. de 2013

Quem ama vive menos

É quando o amor por alguém chega e domina que a vida parece ser mais curta, pois há um imenso desejo de estar sempre junto de quem se ama e nenhum tempo é suficientemente bastante para saciar este desejo.


Por isso dá para aceitar que quem ama tem vida curta, mas quem não ama tem tempo de sobra para viver correndo atrás do que vale menos. Já dizia Cora Coralina“[...] sei que nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas. Muitas vezes basta ser: colo que acolhe, braço que envolve, palavra que conforta, silêncio que respeita, alegria que contagia, lágrima que corre, olhar que acaricia, desejo que sacia, amor que promove. E isso não é coisa de outro mundo, é o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela [...] seja intensa, verdadeira, pura enquanto durar. Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.”

O amor também arranca coisas que não queremos dar, filtra impurezas e alimenta os estímulos. Ele é o mistério, pois não pode ser explicado, e se não é explicado, não pode ser entendido, deve ser vivido, experimentado e agarrado para preencher os espaços vazios que ficaram das coisas que foram arrancadas. No fim, amor é alívio e tensão, descanso e constante dedicação. É um misto de sentimentos benditos, mas quando em atrito, é um mal a ser suportado. Já que ninguém ama impunemente.

Vivendo por dentro este gostoso paradoxo, Carlos D. de Andrade escreve: “Ainda que mal pergunte, ainda que mal respondas; ainda que mal te entendas, ainda que mal repitas; ainda que mal insista, ainda que mal desculpes; ainda que mal me exprima, ainda que mal me julgues; ainda que mal me mostre, ainda que mal me vejas; ainda que mal te encare, ainda que mal te furtes; ainda que mal te siga, ainda que mal te voltes; ainda que mal te ame, ainda que mal o saibas; ainda que mal te agarre, ainda que mal te mates; ainda, assim, pergunto: me amas? E me queimando em teu seio, me salvo e me dano...de amor.”

Como é bom saber também que o amor não acaba, não aquele amor rótulo de qualquer outro sentimento bom e forte, mas o amor mesmo, o de verdade. Um que não é paixão avassaladora, mas imersão sorrateira, não aquele sentimento de fogo na carne, mas aquele de incandescência suave. Algo pelo qual vale a pena lutar e enfrentar as consequências, ainda que a última consequência seja o fim da vida curta que temos, mesmo assim, não pare, não pare de amar; foi o que ensinou Helder Câmara“Não, não pares. É graça [...] começar bem. Graça maior, persistir na caminhada certa; manter o ritmo...Mas a graça das graças é não desistir. Podendo ou não podendo, caindo, embora, aos pedaços, chegar até o fim...”