Páginas

22 de jan. de 2012

Pop art na propaganda para classe C


Na minha modesta opinião, desde que Marcel Duchamp em 1913 inventou o conceito ready-made (pronto-feito), migrando um elemento da vida cotidiana, originalmente não reconhecido como arte, para o campo das artes, o mundo nunca mais foi o mesmo, nem a publicidade. Marcel foi contemporâneo do Dadaísmo, e para muitos, o dadaísta por exelência. Dadaísmo (movimento surgido em Zurique 1915 durante a guerra mundial) é a oposição a qualquer tipo de equilíbrio na arte, uma espécie de antiarte. Combinava o pessimismo irônico e ingenuidade radical ao ceticismo absoluto e improvisação. Enfatizava o ilógico para protestar contra a loucura da guerra e sua principal estratégia era mesmo denunciar e escandalizar, libertando a arte da prisão racional para que fosse apenas o resultado do automatismo psíquico, selecionando e combinando elementos por acaso.

Os ready-mades de Duchamp constituem o espírito que caracteriza o dadaísmo. Sua tendência extravagante e baseada no acaso serviu de base para o surgimento de inúmeros outros movimentos artísticos do século XX, entre eles o Surrealismo, a Arte Conceitual, a Pop Art e o Expressionismo Abstrato, dos quais, destacarei apenas alguns aspectos da Pop Art. Surgida no final da década de 50 nos Estados Unidos e Inglaterra, elevava à categoria de arte as coisas do dia-a-dia e as difundia pelos meios de comunicação de massa, em cartazes publicitários, luminosos, comestíveis enlatados, exibição de produtos, rótulos, jornais, revistas, eletrodomésticos, automóveis, sinais de tráfego, histórias em quadrinhos e etc. O artista pop vê mais sugestões estéticas em um supermercado do que em uma paisagem da natureza, abre os olhos para o mundo e compreende a beleza que está em qualquer ambiente, com as modificações que a tecnologia trouxe à vida moderna, expressando esses valores em suas criações.

Há quem diga inclusive eu, que neste momento a pop art faz o caminho inverso do movimento que a inspirou, ou seja, aquele ready-made dadaísta que protestava contra a guerra do mundo teoricamente provocada pelo capitalismo, agora assume a indumentária de arte popular para servir como soldado da guerra capitalista no campo do consumo de massa, daí então, a arte marginal começa ganhar espaço no mundo. E se no passado Andy Warhol criou para as famosas sopas Campbell’s e Coca-Cola, hoje, Mulheres Barbadas criam para o Google, Bruno Big, Fefe Talavera, Nina Moraes e Jotapê grafitam as latas de Sprite, além de Adhemas Batista, Eduardo Recife e Fernando Chamarelli que expressam suas impressões sobre a Vodka Absolut em tela, está tudo na internet.

Quando ouvimos o happer Criolo cantar, “neste labirinto místico onde os grafites gritam”, ou como cantou os Racionais MCs, “é na periferia onde vive a maioria”, concluímos: nada melhor para falar com a massa consumista, do que seu próprio idioma cultural. Onde quero chegar com tudo isso? Bom, você deve ter percebido por aí, a grande valorização de elementos característicos desta arte de rua na mídia, em campanhas conceituais de diversas marcas famosas estabelecendo tendência. Será que reconhecer estas expressões de protesto de rua como arte popular e inseri-las na publicidade, mesmo que pretensiosamente, anunciam que o povo em breve, oxalá seja muito em breve, crescerá na capacidade crítica para reivindicar sua vida, por hora escrava na mão dos incompetentes? Isto é o que eu desejo, mas infelizmente acredito que ainda não acontecerá! Este fenômeno moderno caracterizado pela ascensão da pop art tem uma relação direta com a ascensão da Nova Classe Média; sabe porque?

Preste atenção: Classe “C” no Brasil é o grupo que atualmente representa 90% da população brasileira, é responsável por 79% do consumo total de bens, atinge 69% do mercado de cartões de créditos, são 86% do total de internautas no Brasil e movimentam mais de 760 bilhões por ano. Ganham individualmente entre 1.200 a 2.000 reais, e em uma família de 4 pessoas tem renda média entre 2.900 a 4.800 reais.

Talvez todo impulso à maravilhosa pop art que tanto admiro como inspiração de vida, tenha uma raiz muito mais oportunista, mercadológica e publicitária do que de valorização artística. Através desta estratégia de comunicação, a maioria consumista, adere rápida e facilmente às marcas associadas a esta linguagem, porque amplificam seus valores e vozes, outrora ecoadas sem efeito nos guetos da periferia – sentem-se valorizados porque veem suas vidas contadas pelas marcas que consomem. E resta ainda uma última questão: Porque os artistas do protesto se rendem ao mercado? Simples; eles cantavam por melhores condições de vida e grafitavam por direitos iguais, consequentemente o mercado precisando desta voz para vender seus produtos a todos que reivindicavam com eles, respondeu ao desejo cantado e grafitado com dinheiro que lhes confere tais direitos. Agora também eles, têm status de artista e reconhecimento internacional, seja nas grandes galerias de arte em Londres ou nos grandes corredores de hipermercados do Brasil.

Não há nada de errado nisso, é apenas o ciclo de nossa vida no mundo, transformando tudo em algo que possa ser vendido e persuadindo a todos que possam comprar; ou será que não é isso?


7 comentários:

  1. Marcelão!!! Sou seu fã!!!! Muito bom o texto!!! Parabéns!!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Vlw amigão, não mereço mas agradeço as palavras de incentivo, abraço e até logo na facul...rs.

      Excluir
  2. a Arte que deveria ser um meio de educação da afetividade muitas vezes está comercializada...será que os afetos estão demasiado voltados ao financeiro? ou será que a necessidade de sustento exige hoje a venda da arte? mas porque não ganhar a vida com a arte? seria bom que se ganhasse com a arte, mas de um modo que não ferisse os princípios e valores daquele que é o artista, mas parece que algumas vezes se vende ou não se tem estes valores...aí é um problema crítico! A arte trabalha em nós a afetividade...e como estamos trabalhando nossa afetividade? eu particularmente prefiro a arte que não causa sentimentos desagradáveis...mas se o afeto do artista está ferido! é um modo de transmitir isto... mas acho que a arte precisa sim de alguns limites, se for para expôr publicamente... o modo como a pessoa trabalha a si mesmo pela arte é questão dela...mas expor uma arte...deveria ter sensura sim! pois a arte pode ser muito violenta, pode violentar...se não podemos violentar alguém com os braços, por que poderíamos com os "traços"? pior que ferir o olho é ferir o olhar! pior que ferir o coração como carne é ferir os sentimentos... bem, acho que me distanciei um pouco da questão abordada hehehehehe... mas pus um pouco da minha opinião sobre arte
    rsrsrsrs

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Muito obrigado Márcia por sua contribuição, a única coisa que acredito nunca ser bem-vinda é a famigerada censura, ela nunca pode ser aceita ou imposta, porque abre margem ao que hoje é a maioria perder sua autonomia quando vier eventualmente a ser apenas uma minoria - toda censura é medo de perder o que acredita, mas quem vive o que crê morre sem perder.

      Excluir
    2. caríssimo amigo Marcelo: eu penso que HÁ CONTROVÉRSIAS... mas me pergunto: porque é tão ruim a censura? acho que ela não deve ser uma ditadura,mas se todos exporem tudo o que quiserem a todos? como será então? nem um mínimo de limite? e o respeito ?como fica? nem tudo deve ser visto por todos... há coisas que são íntimas e só alguns deveriam ver, alguns nem merecem ver!!! digo isso porque penso como educadora, antes havia uma censura de horário pra certas coisas, e pra certas imagens... e as crianças? tudo tem um limite...é questão de respeito pela liberdade do outro, porque meus filhos (embora não os tenha hehehehe) são mergulhados em um mundo de informações precocemente? coisas que ainda não estão preparados para ver? não precisa ser proibido...mas que dê liberdade para quem não quiser ver , que não veja...que não precise baixar os olhos... e os filhos?? acho que minha liberdade não pode invadir a do outro...isso seria violência... concorda??

      Excluir
    3. Bom, vamos lá, a censura é ruim por 2 motivos, primeiro porque suprime a liberdade do outro, liberdade que aliás não quero tê-la suprimida e se todos são iguais, logo todos merecem gozar dela. Segundo porque os que hoje são censurados, se amanhã no poder, irão nos censurar por justiça e por direito, portanto é melhor evitar e não pesar que estarei sempre por cima. A outra questão que é a sua preocupação com a educação, parece que basta reorganizar o que você mesmo escreveu e teremos uma saída possível para interpretar o que eu disse. Liberdade de escolha transmitida por educação aos filhos que quanto menos for obrigada, forçada, mais terá êxito e isso a própria história é testemunha - aos pais e educadores cabe educar com os limites de interesse da família e pronto, teremos pessoas livres que fazem as devidas escolhas. Não?

      Excluir
  3. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir

Sugiro que você coloque o seu nome para eventuais respostas de comentários.